Influencer brasileira em Busan reacende discussão sobre respeito às normas locais, limites da liberdade e responsabilidade em viagens internacionais
A cena parecia simples: uma mulher aproveitando o verão na praia de Haeundae, em Busan, Coreia do Sul. O que causou espanto, no entanto, foi o traje escolhido — um biquíni, comum nas praias brasileiras, mas raramente visto em solo coreano. A turista era brasileira e o vídeo viralizou nas redes, despertando críticas, debates e um alerta: o que significa respeitar a cultura de um país que nos acolhe?
A Coreia do Sul tem se tornado um dos destinos mais sonhados entre brasileiros, impulsionada pela explosão do K-pop, dos doramas e da cultura pop asiática como um todo. Só que nem sempre quem chega está preparado para o que vai encontrar — ou para as regras não ditas que moldam a convivência por lá.
Diferente do Brasil, onde o biquíni faz parte da paisagem urbana nas praias e a exposição do corpo não carrega, necessariamente, um julgamento moral, na Coreia do Sul o uso de trajes de banho é mais discreto. A maioria das pessoas entra no mar usando roupas mais cobertas, como camisetas de manga longa, maiôs fechados ou até shorts. Isso não é repressão: é um reflexo de valores culturais ligados ao pudor, à harmonia social e ao desconforto com o olhar público.
O ponto mais delicado do caso é que a turista em questão não era simplesmente alguém desavisada. Era uma “influencer” brasileira que vive na Coreia do Sul, com audiência ativa nas redes, e que declarou estar fazendo um “experimento social” ao usar biquíni na praia. A justificativa? Ver a reação das pessoas — e mostrar que o namorado coreano aceitou sua escolha. Mas isso levanta mais questões do que respostas.
Um experimento social, por definição, é uma prática pensada para analisar comportamentos ou dinâmicas sociais reais, com método, ética e objetivo claro — quase sempre envolvendo especialistas (sociólogos) ou contextos educativos. Não é simplesmente causar polêmica por views. Quando alguém se expõe intencionalmente em um ambiente onde sabe que haverá choque, apenas para registrar olhares e comentários, o que está sendo produzido ali não é reflexão social, é entretenimento disfarçado de crítica.
E isso é ainda mais problemático quando se trata de uma cultura que, mesmo com avanços, ainda sofre com julgamentos internos, censuras sutis e um sistema social complexo. Ao usar um desconforto coletivo como palco para autoafirmação ou engajamento, o gesto se torna irresponsável — não libertador. Não se trata de agradar ou obedecer aos padrões locais, mas de não usá-los como provocação gratuita.
E isso não é uma crítica agressiva, mas um chamado à consciência. Quando viajamos, somos visitantes. Isso não nos diminui, mas nos convida a ouvir antes de falar, a observar antes de agir.
Liberdade não é fazer o que se quer em qualquer lugar. É entender que nossas escolhas impactam quem nos cerca — ainda mais num país com um código social tão próprio quanto o da Coreia do Sul. O que parece um gesto de empoderamento aqui, pode ser interpretado como desrespeito ali. E ninguém precisa abrir mão da própria identidade para se adaptar: é possível equilibrar autenticidade com empatia.
Esse caso nos convida a refletir. Quantas vezes agimos com superioridade cultural sem perceber? Quantas vezes olhamos o “diferente” com ironia, como se o outro fosse atrasado ou exagerado? Respeitar não é concordar com tudo — é aceitar que existem outras formas de viver e, quando estamos na casa do outro, é justo acolher essas formas com cuidado.
Viajar é lindo, transformador, mas também exige escuta e humildade. Que a gente leve sempre o melhor da nossa cultura para o mundo — mas também saiba quando é hora de aprender com o outro.
Você já viveu uma situação assim? Compartilhe sua experiência e vamos ampliar essa conversa com respeito e consciência.
Até a próxima polêmica para refletir.
Marcela Fábio
CEO e Editora Chefe
Imagem: Doramazine