Um romance animado sul-coreano que une ciência, saudade e destino sob o frio infinito do espaço.
Caminhar entre estrelas já foi metáfora, agora torna-se realidade em Separados pelas Estrelas (“I byeol-e pil-yo-han”), filme de animação de 2025 da Netflix e da Coreia do Sul. A obra propõe mais que um simples conto romântico: ela explora os limites da distância, do tempo e da esperança. Convido quem gosta de drama emocional, ficção científica humanista e tramas que aliam o íntimo ao cósmico a embarcar nessa análise — porque aqui o que nos move não é só o amor, mas o que ele arrisca no universo.
Personagens e suas trajetórias psicológicas: medo, sonho e perda
Nan-young: cientista, filha de astronauta. Sua vida está marcada pela ausência desde cedo, pois a mãe parte numa missão espacial para Marte e não retorna. Esse vazio motiva tanto sua carreira como astronauta quanto seu desejo quase obsessivo de reencontro. Psicologicamente, ela vive um conflito constante entre o rigor da ciência — visão controlada, calculada — e os abismos emocionais da saudade. Sua jornada reflete uma dor muito comum em histórias asiáticas que ponderam dever familiar, sacrifício e destino pessoal.
Jay: músico que conserta vitrolas antigas, mantém vínculos com o passado através de objetos, de melodias. Ele representa a nostalgia, o lembrar como prática de amor. Seu encontro com Nan-young inaugura uma ponte entre dois mundos: o real, o terreno, os discos, o som — e o outro, imensurável, do espaço, do insondável. Ele é o contraponto emocional mais acessível, porém também carrega inseguranças: pode o amor resistir quando a gravidade que sustenta os corpos não existe mais para unir?
Ambos mais do que personagens de romance são símbolos culturais: Nan-young de uma sociedade que valoriza conquistas, progresso e disciplina científica; Jay de uma alma estética, ligada à herança, ao silêncio entre os sons perdidos, ao valor do tangível.
Análise (com spoilers)
A narrativa se inicia com o desaparecimento da mãe de Nan-young — missão científica, Marte, sondas que falham. Esse ponto de partida já define o tom: o espaço como cenário de maravilha e de terror, de possibilidades e de abismos de solidão.
Quando Nan-young é selecionada para missão espacial com objetivo de reencontrar a mãe, tudo o que ela vive na Terra — inclusive o encontro com Jay — ganha urgência. O cerne dramático se estabelece não apenas no risco físico da viagem, mas no risco de perder aquilo que define quem ela é: memória, laços, amor terreno.
O romance entre ela e Jay floresce lentamente, cercado por pequenas cenas: consertar a vitrola da mãe, conversar sobre o peso do passado, olhar para estrelas. Essas cenas têm poder porque contrastam com a imensidão fria do espaço futurista de Seul em 2050.
No clímax, Nan-young parte, empurrada por sua missão. A separação física é inevitável. E mesmo quando ela alcança Marte, ou tenta alcançar sua mãe, o filme não oferece consolo fácil: a comunicação é fragmentada, os ecos do espaço profundo são metáforas da distância entre corações. O final deixa em aberto a questão: será que amor, promessa e desejo podem vencer o silêncio do universo?
Aspectos técnicos: estética, trilha sonora e desenvolvimento do roteiro
Visuais e direção de arte: Seul futurista em 2050 é muito mais que pano de fundo. A ambientação mistura tecnologia avançada com o familiar — vitrines, ruas banhadas por luzes de néon, vitrolas antigas, lojas de discos. Essa justaposição reforça o tema: entre passado e futuro, entre sentimental e científico. A paleta de cores oscila entre tons frios do espaço (azuis escuros, pretos, cinzas), e o calor da Terra (amarelos, laranjas, a luz do pôr do sol) quando o foco está no encontro humano.
Roteiro: conciso (cerca de 1h36m) o filme evita prolongar demais certas sequências, mas algumas decisões de ritmo frustram: o momento de desenvolvimento entre Jay e Nan-young poderia ser mais aprofundado; algumas reviravoltas científicas são deixadas no vago, mais como motivação externa do que confronto interno. Ainda assim, o roteiro acerta ao evitar clichês fáceis: não há vilão humano ou obstáculo puramente dramático fora do próprio espaço e da distância, que se mostram antagonistas poderosos.
Trilha sonora: trabalha com delicadeza. As músicas ecoam nostalgia, silêncios pesados nos momentos de separação. Há momentos de silêncio, de reverberação, que fazem lembrar que o som, para quem está no espaço ou longe, pode ser uma ponte ou um lembrete cruel. A escolha de Jay como músico restaurador de antigos instrumentos reforça a importância da música não só como trilha, mas como memória.
Conclusão: nota e justificativa crítica
Nota: 4,0 / 5
Separados pelas Estrelas entrega um romance contemplativo e melancólico que eleva o gênero ao usar a ficção científica como espelho da condição humana. Suas virtudes estão no aprofundamento emocional de Nan-young, na metáfora constante entre espaço físico e psíquico, e na estética cuidadosa. Peca um pouco no ritmo em certos momentos e na superficialidade de alguns conflitos secundários, mas isso não diminui sua força central.
Se gostas de histórias que fazem a gente olhar para o céu não apenas como paisagem, mas como metáfora do que sentimos por dentro, este filme é para ti. Vale assistir com atenção, absorver os pequenos detalhes — a vitrola, o silêncio espacial, o som do vento em Seul futurista —, comentar com amigos que curtem cinema asiático ou ficção científica, e compartilhar. Quem sabe, ao fim dos créditos, não fiques olhando para as estrelas — e pensando em quem amamos, mesmo que estejam distantes.
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Até o próximo post!!
Marcela Fábio
CEO e Editora Chefe
Imagem: Divulgação